Direito Contraordenacional

 

Trabalhamos há quase duas décadas, ou seja, há suficiente tempo no domínio das matérias relacionadas com as contra-ordenações para podermos dizer que, talvez com excepção do direito penal, não há área de actividade em que os direitos das pessoas adquiram uma importância pessoal assaz significativa, ou seja, uma expressão social tão relevante e uma gravidade individual tão intensa.

 

No direito penal o advogado penalista convive com alegados agressores e com infelizes vítimas, com o sentimento que a linha que divide o criminoso do cidadão comum, a vítima do outro, ou de nós mesmos, é tão ténue e tão pouco divisora que quase nada significa. Não há, pois, criminosos e os outros, vítimas e pessoas com sorte, não há etiquetas que resistam a constatação que qualquer um de nós pode cometer um crime, ou ser vítima de crime, e que todos podem cometer ou ser alvo de actos típicos, ilícitos, culposos e puníveis, sobretudo agora com o alargamento dos crimes a actos ou omissões com conteúdo ético menos marcado.

 

No direito contra-ordenacional a universalidade das pessoas real ou potencialmente atingidas vai muito mais longe. Há proibições que a própria razão desconhece. Há coimas elevadíssimas que mais parecem instrumentos de confisco. Há sanções acessórias que mais parecem uma morte civil. O processo é simplificado. Ou, dito de outro modo, o processo não garante os direitos mínimos de audiência e defesa. Está tudo nas mãos de autoridades administrativas omnipresentes, omniscientes e omnipotentes. Só o direito ao juiz pode limar abusos e excessos, injustiças e precipitações. Mas para isso é necessária uma intervenção precoce do advogado na fase administrativa e uma acção enérgica na fase judicial.

 

O direito punitivo hoje já não tutela apenas o direito à vida e à integridade física, os direitos patrimoniais, direito à honra, os direitos à liberdade e de auto determinação.

 

Vai muito para além do essencial à vida em comunidade. É instrumento de dissuasão e de repressão de comportamentos que lesem o fisco, a segurança social, o mercado, a indústria, a saúde pública, a economia, a segurança rodoviária, a credibilidade de transacções comerciais, a transparência da vida política e pública, a privacidade e a intimidade da vida privada.

 

E porque o direito penal quase tudo tutela ou tudo pretende regular e proteger e porque o direito contra-ordenacional veio para colmatar as falhas daquele e para alargar os poderes do Estado sobre as Empresas e sobre os Cidadãos, é evidente que se tornou ramo de direito sancionatório omnipresente e cada vez mais interveniente, complexo, necessário… e perigoso.

 

Porque aqui, neste domínio e com toda a propriedade, mais vale mesmo prevenir que remediar; impõe-se a consulta a um advogado, antes que seja tarde demais.