25 Junho, 2012

O decálogo do Não

I. Não
responderás a nenhum senhor e, com total autonomia e independência, só
cumprirás os ditames da tua consciência, de acordo com a lei justa e o
interesse do cliente que te confiou tudo, a sua liberdade, a sua
intimidade, o seu património ou a sua honra, enfim a sua vida.

 

II. Não te submeterás ao próximo ou ao poderoso, nem que ele seja o teu
melhor amigo ou o teu cliente, sobretudo quando te peçam para
responsabilizar a vítima, culpar o inocente ou violar a lei; nem muito
menos temerás o juiz ou o procurador, pois que devem ser eles a mostrar
reverência pela tua seriedade, paciência, empenho, capacidade de
trabalho e domínio do caso confiado.

 

III. Não trabalharás
apenas quando tal te for necessário, agradável ou compensador, mas
sempre que puderes pacificar o conflito ou restituir a liberdade a quem a
perdeu imerecidamente, a dignidade ou o respeito a quem lhe foi negado o
mínimo e a casa ou o pão a quem tal lhe foi injustamente retirado ou
restringido.

 

IV. Não te limitarás a ser um técnico, porque se
assim for serás um péssimo advogado; terás que ser Homem ou Mulher de
princípios e valores, respeitar a tua Família ao menos ao ponto de não a
negligenciares, e abrir os teus horizontes ao Outro, à Cultura e às
Civilizações, porque só conhecendo as virtudes e os vícios da sociedade
poderás melhor compreender as razões da maldade ou da bondade do ser
humano.

 

V. Não desrespeitarás nunca o que há de mais sagrado
no ser humano, desde logo a sua vida, mas, também, a sua dignidade, a
sua condição de ser livre, os seus direitos fundamentais e naturais e a
sua pluralidade de pensamento, liberdade de expressão e diversidade na
acção.

 

VI. Não cometerás adultério aos teus juramentos de
respeito pela lei justa, de fidelidade à justiça no direito, de
fidedignidade aos interesses do representado, de lealdade para com os
colegas e de salvaguarda absoluta do segredo do que te for relatado.

 

VII. Não abusarás da fragilidade quer dos que a ti recorrem quer daqueles
contra quem litigas; agirás sempre com lealdade e frontalidade, mesmo
que ainda assim não atinjas os objectivos imediatos a que te propunhas e
até aches justos, pois que nem todos os fins justificam os meios; o que
não impede que sejas frontal e corajoso e lutes com bravura pela
vitória.

 

VIII. Não usarás da mentira, do erro, ou do engano,
nem pactuarás com expedientes menos sérios; agirás sempre com rigor e
verdade, ainda que realces apenas as verdades que beneficiem o teu
cliente; e fá-lo-ás sempre com rigor, contenção e parcimónia não
extravasando do foro ou do patrocínio, pois que o advogado não é nem
arauto, nem político, empresário, jornalista ou actor.

 

IX. Não
misturarás a tua missão com outros interesses que não os da justiça ou
com outros negócios que não os do teu cliente; se és advogado não és
empresário, negociante ou patrão; serás sempre livre e disponível e só
verás outro advogado como teu colega e não como subordinado.

 

X. Não cobiçarás mais do que a igualdade de todos os cidadãos, a justiça
de todas as decisões e a equidade no exercício de todos os poderes;
sobretudo não cobiçarás o que não te pertence, pois que, enquanto
advogado, na cobrança não és credor, no negócio não és comissionista, na
sociedade não és sócio nem quinhoas nos lucros e na partilha não és
herdeiro.

 

Carlos Pinto de Abreu